A Munganga Promoção Cultural

A MUNGANGA PROMOÇÃO CULTURAL: O Brejo é Isso!

sexta-feira, 18 de agosto de 2023

ANTÔNIO VICELMO, A VOZ ICÔNICA DO RÁDIO CARIRIENSE



Antônio Vicelmo é a voz icônica do rádio carirense; sem dúvida, um dos mais respeitados jornalistas do Ceará. Nascido em Brejo Santo (CE), em 10 de Janeiro de 1942, e radicado na cidade de Porteiras (CE) durante a infância, é filho da primeira professora nomeada pelo Estado, para ali laborar, d. Maria do Carmo Simplício, e do boticário Vicente Anselmo. Foi naquela terra, sob a proteção de Nossa Senhora da Conceição, onde Vicelmo realizou os primeiros estudos, tornou-se coroinha e sentia em si a vontade de desbravar o mundo, conhecer as notícias de fora, ultrapassar os limites do seu pequeno rincão do sul cearense. Nessa época, o menino sonhava em ser caminhoneiro, perder-se nas estradas do Brasil e matar sua sede e curiosidade do universo, além de Porteiras e Brejo Santo, cidades primas-irmãs, seu único itinerário conhecido. Complementou os estudos em Missão Velha e Crato, cidade esta onde posteriormente veio a residir e concluir o curso de bacharelado em Direito, primeira turma.

Nos seus quase sessenta anos de jornalismo, fosse na rádio Araripe, na rádio Educadora do Crato, ou nos jornais impressos em que teve a oportunidade de atuar, Antônio Vicelmo tornou-se conhecido por difundir a cultura genuína do Cariri, do sertanejo, principalmente no seu viés mais folclórico. Manchetes como “O homem que apanhou da Caipora” e a inusitada entrevista a Vicente Finim, o autodeclarado lobisomem das sete freguesias do Cariri, a despeito de enlouquecerem os editores, fizeram a fama do jornalista, tornando-o em um dos mais cultuados arautos da cultura nordestina. 


 

O jornalismo de Antônio Vicelmo é diferenciado e revolucionário, pois vai além da informação precisa. Misto de poesia, literatura e encantamento, sua palavra é carregada de intimidade e saudosismo, arrastando o ouvinte e o leitor para a nostalgia até do que não se viu, do que não se viveu.

No seu mister de jornalista, Vicelmo teve a sorte de trabalhar ao lado de grandes intelectuais da nossa região, a exemplo de J. de Figueiredo Filho, que nos legou uma inestimável bibliografia, mormente no campo do folclore, coincidente com o afã do jovem Vicelmo daquele tempo. 

É membro do Instituto Cultural do Cariri, que tanto tem feito pela divulgação e preservação de nossa história. 

Segundo Antônio Vicelmo, por ele mesmo: “Mesmo com esse jeito matuto de redigir notícias que, muitas vezes, fugia às regras acadêmicas, fui muito prestigiado pela direção do Diário do Nordeste. Viajei meio mundo por conta do jornal. Andei no rastro  dos cangaceiros nos estados do Ceará, Pernambuco, Bahia, Alagoas e Sergipe. Estive, várias vezes, na Grota do Angico, onde mataram Lampião. Acompanhei as obras de transposição das águas do São Francisco e da Ferrovia Transnordestina, do começo ao fim. Estive em Cabrobó, de onde sai o canal que transporta a água do rio para o Ceará. Documentei a desocupação da cidade de Jaguaribara, que foi inundada pelas águas do Açude Castanhão. Levei para as páginas do jornal o modo de vida dos moradores da Nova Jaguaribara, que deixaram para trás lembranças indeléveis, entre as quais o monumento a Tristão Gonçalves de Alencar, herói do Confederação do Equador, que foi assassinado barbaramente nas terras de Jaguaribara. Mostrei para o mundo o rico patrimônio fossilífero do Cariri. Descrevi as secas e suas consequências; descobri os profetas das chuvas, os mitos que povoam o imaginário popular do Cariri. Quase viro romeiro de tanto falar sobre o Padre Cícero e o beato José Lourenço. Fiz uma série de reportagens sobre os penitentes e o Padre Ibiapina, o apóstolo do Nordeste.”

Entrevistou grandes nomes da nossa cultura, como o Rei do Baião, Luiz Gonzaga, e o poeta Patativa do Assaré, de quem se tornou amigo íntimo; mas, sobretudo, capturou as vivências do homem sertanejo anônimo, com seus saberes, suas curiosidades, suas idiossincrasias, seus misticismos, suas singularidades. 

Foi o primeiro repórter do Cariri a escrever para o jornal sobre os penitentes de Barbalha, Seu Lunga, Expedito Seleiro, a Casa Grande de Nova Olinda e a Caldeira do Inferno, em Brejo Santo.



  

Fez parte da equipe do Diário do Nordeste que ganhou o Prêmio Esso de Jornalismo e, em 2014, um texto seu foi objeto de uma questão do Exame Nacional do Ensino Médio - ENEM.

Por conta de seu profundo conhecimento da história do Cariri, representou o Diário do Nordeste, indo até Roma para acompanhar a comissão que solicitava a reabilitação do Padre Cícero, promovendo de forma singular a cobertura jornalística dessa caravana.

Em 2015, escreveu E era só… 50 Anos de Jornalismo, um apanhado de crônicas que ilustram sua rica caminhada.

É casado com Marisa Maria, seu devotado e eterno amor, com quem teve quatro filhos: Paulo Ernesto, Pedro Henrique, João Ricardo, Marcos Eduardo e Érica Vanessa, esta última, filha do coração.

Muitas são as habilidades e os dons de Antônio Vicelmo. É um multi-instrumentista da arte. Sua casa é também um ateliê, onde, nas horas vagas, fabrica carros e caminhões de madeira, além de aviões, em forma de cataventos, que ornam o jardim de sua aconchegante morada, ao sopé da Chapada do Araripe, no bairro Grangeiro, do Crato, onde sente os cheiros e gostos do Cariri, divertindo-se com as peripécias de seu neto, José, de quem virou “avôhai”, depois que seu filho Pedro Henrique se encantou.

Pragmático, sem medo da morte, que considera uma condição inevitável e natural, Antônio Vicelmo já deixou escrita uma carta de despedida, para ser lida em seu funeral, ressaltando o amor, sentimento que mais exercitou em toda sua vida. Enquanto vive, e a gente espera que assim continue entre nós por muitos anos, continua a nos encantar com sua voz inconfundível, diretamente de seu estúdio particular, cercado de rádios antigos, condecorações, pelas ondas da SomZoom, 106.5, vestido inteiro da alma profunda do Cariri.


Hérlon Fernandes Gomes, Brejo Santo - CE

08 de Agosto de 2023



Para Helaine e Kilmer, minha irmã e meu cunhado, vizinhos de Antônio Vicelmo e d. Marisa, arquétipos desse casal cercado de amor.

Para Bruno Yacub, que me acompanhou para conhecer Antônio Vicelmo pela primeira vez. Identificamo-nos sobremaneira com o festejado jornalista, uma grande inspiração.